quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

pra onde vão as pessoas quando a porta do elevador fecha?

ela chegou ao lar que outrora foi seu.
esboçou um gesto de continência para o dono, não encostaria nele, e pediu licença para entrar.

suspirou, e com a voz que ele não ouvia há muito tempo, avisou que não se alongaria, tentaria ser mais breve possível para não atrapalhá-lo - era uma desculpa qualquer pra justificar o fato de que o cheiro daquela casa, e que principalmente, a figura dele a enojava.

dispôs as duas malas vazias na sala.
fitou mais uma vez o jeito estranhamente forçado dele se mostrar arrependido ou desconfortável, buscou na memória todas as vezes que viu aquele mesmo conjunto de gestos, e concluiu rapidamente que não era arrependimento, era só desconforto, aquele que ela também sentia.

ouviu que ele resmungou algo inaudível, ele nunca sabia falar, sempre resmungando, sempre sorrateiro, agora a fazia lembrar um verme, arrastado, asqueroso.

em pouco tempo lotou a mala. as duas.
havia, enfim, recuperado todo seu tesouro. seus próximos anos de leituras estavam ali.

quando foi buscar a tv que estava no quarto, ele se ofereceu para ajudá-la. recusou.
jamais aceitaria nenhum tipo de favor daquele homem. nenhum tipo de ajuda, nunca mais.

saiu primeiro com a tv nos braços, sem sequer olhar pra ele, voltou, levou as malas.

parecia o fim de um sequestro estranho.

ela havia consentido deixar o que tinha de mais valioso nas mãos de seu pior inimigo.
não teve explicação lógica pra justificar isso.

no corredor, prestes a pegar o elevador, em liberdade, enfim, não respondeu ao "adeus" que ele lhe deu.
pra quê renovar um adeus que já foi dado? meses atrás?

e ele, ah... ele não mereceria ouvir nem mais uma palavra dita por ela.

ele não merecia sequer a lembrança da última imagem dela.
aqueles últimos segundos antes que a porta do elevador se fechasse.

o poço do elevador é a retirada brusca de uma presença.
tem gente que faz questão de viver a beira dele.






perdendo todas as pessoas que um dia conquistou.

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